Por que a cidade de São Paulo se tornou a cidade mais industrializada do Brasil?

A cidade de S�o Paulo � um dos mais impressionantes casos em todo o mundo de intensa urbaniza��o associada diretamente a um processo de industrializa��o. De uma relativamente pequena vila durante o per�odo colonial e a maior parte do s�culo XIX, S�o Paulo tornou-se uma das maiores cidades de todo o planeta, com cerca de 10,5 milh�es de habitantes. A regi�o metropolitana, composta por 37 munic�pios nos arredores da cidade, possui quase 18 milh�es de moradores.

O final do s�culo XIX foi decisivo para a hist�ria da cidade. S�o Paulo passou por grandes transforma��es econ�micas e sociais naqueles anos, em grande medida devido � expans�o da lavoura do caf� e o afluxo de imigrantes europeus. J� no in�cio do s�culo XX, seu relevante parque industrial come�a a ser formado. Distritos como Br�s (sede tamb�m da famosa �hospedaria dos imigrantes�, onde os rec�m-chegados trabalhadores europeus e asi�ticos eram recepcionados), Lapa, Mooca e Barra Funda tornaram-se bairros oper�rios, dada a alta concentra��o de ind�strias nessas regi�es e a proximidade com ferrovias e rios que cortavam a cidade.

O crescimento econ�mico proporcionado pelos lucros do caf� e da industrializa��o incipiente transformou a cidade, que ganhou fama de �moderna�, atraindo intelectuais e artistas vanguardistas. O desenvolvimento, no entanto, foi profundamente desigual e marcado por conflitos e p�ssimas condi��es de vida para os trabalhadores e para a maioria da popula��o paulistana. Assim, se de um lado, no ano de 1917, uma orgulhosa e ascendente elite empresarial inaugurava a Primeira Exposi��o Industrial no suntuoso Pal�cio das Ind�strias [1], edif�cio especialmente constru�do para este fim, por outro, associa��es e sindicatos oper�rios da cidade organizavam naquele mesmo ano a maior greve e manifesta��o p�blica at� ent�o vistas. Al�m de principal centro econ�mico do pa�s, S�o Paulo tornava-se tamb�m o maior p�lo de organiza��o de trabalhadores brasileiros.

O decl�nio do caf� a partir dos anos 1930 e as pol�ticas nacional-desenvolvimentistas do governo Get�lio Vargas naquele mesmo per�odo acentuaram o crescimento urbano e a voca��o industrial da cidade, aceleradas ainda mais nas d�cadas seguintes ao final da II Guerra Mundial. Nos 20 anos que separam 1950 de 1970, a capital paulista triplicou seu tamanho. Novos trabalhadores viabilizavam um poderoso crescimento da atividade industrial. Desta vez, migrantes de origem rural, vindos do interior do Brasil, particularmente da empobrecida regi�o Nordeste. S�o Paulo definitivamente consolida-se como uma cidade de migrantes. O censo populacional de 1970, por exemplo, apontava que quase 70% da popula��o trabalhadora da cidade havia passado por algum tipo de experi�ncia migrat�ria. [2]

Os trabalhadores oriundos dos estados nordestinos compunham a grande maioria dos rec�m-chegados e empregavam-se em massa nos variados ramos da ind�stria e servi�os em franca expans�o na regi�o metropolitana. Nos anos 50, essa regi�o foi a principal respons�vel pela elevada taxa de crescimento industrialdo pa�s.

Entre 1945 e 60 o setor secund�rio no Brasil cresceu em m�dia 9,5% ao ano, constituindo-se em um dos mais acentuados processos de industrializa��o no per�odo em todo o mundo. Em 1959, por exemplo, quase 50% de todo o emprego fabril do pa�s estava concentrado no estado de S�o Paulo [3]. A pol�tica econ�mica do regime militar instalado em 1964, embora de maneira socialmente excludente e concentradora de renda, ampliou o peso da ind�stria na economia nacional e facilitou a instala��o e concentra��o de plantas de empresas multinacionais, em sua maioria na regi�o metropolitana da cidade de S�o Paulo.

A partir dos anos 1980, no entanto, embora o estado de S�o Paulo tenha permanecido incontestavelmente como a regi�o brasileira mais industrializada, a cidade de S�o Paulo diminuiu gradativamente sua participa��o na produ��o industrial do pa�s. A participa��o do setor secund�rio municipal no total da for�a industrial do estado caiu de 36% em 1980 para 22% em 1990 [4]. Na d�cada seguinte, uma veloz reestrutura��o produtiva com profundas mudan�as tecnol�gicas, as cont�nuas transfer�ncias de f�bricas para outros estados e os processos de fus�o e incorpora��o de empresas tradicionais por grupos estrangeiros aceleraram a desindustrializa��o da cidade [5].

Esse processo tem provocado o fechamento de f�bricas, manufaturas e vilas oper�rias, a deteriora��o das edifica��es e equipamentos e at� mesmo a simples demoli��o de muitas delas, v�timas da voracidade da especula��o imobili�ria na cidade. Muitos desses patrim�nios possuem importante valor arquitet�nico, representando diversas fases do desenvolvimento industrial brasileiro, e tamb�m profundas rela��es hist�ricas, culturais e afetivas com as comunidades que os circundam.

Por outro lado, a preserva��o de f�bricas e de todos os elementos que integram a atividade fabril j� �, h� algumas d�cadas, uma forte tend�ncia urban�stica e tur�stica em v�rias partes do mundo. Al�m do aspecto hist�rico de tal preserva��o, sem d�vida fundamental, o impacto educacional e cultural de tais iniciativas, tem se mostrado bastante promissor em v�rias dessas experi�ncias, com desdobramentos positivos nos campos econ�mico, social e ambiental. A preserva��o de espa�os industriais, embora ainda em pequena escala, j� � tamb�m uma realidade no Brasil.

Na cidade de S�o Paulo existem algumas experi�ncias bem sucedidas de transforma��o de antigas f�bricas em espa�os culturais e educacionais, como s�o os casos do Sesc Pomp�ia (entre os bairros da Lapa e Barra Funda), do Sesc Belenzinho (na Mooca) e das Faculdades Anhembi Morumbi em uma antiga f�brica de cal�ados no Br�s. Mais importante ainda, nos �ltimos anos tem ocorrido uma s�rie de iniciativas e mobiliza��es de movimentos sociais comunit�rios pela preserva��o de antigas f�bricas e espa�os industriais e oper�rios. A��es em torno na Vila Maria Z�lia (vila oper�ria pr�xima ao Br�s e Mooca), do Cotonif�cio Crespi na Mooca, Cia. Nitro Qu�mica em S�o Miguel Paulista e as f�bricas Matarazzo Petybom e Melhoramentos na Lapa s�o algum exemplos dessas mobiliza��es que buscam n�o apenas garantir uma melhor qualidade de vida para os moradores dessas �reas, mas tamb�m preservar a mem�ria dos trabalhadores, migrantes e moradores pobres que constru�ram a riqueza e o desenvolvimento da cidade.

Tais iniciativas e outras mais em v�rias regi�es do pa�s estimularam um grupo de acad�micos de diferentes �reas (historiadores, soci�logos, arquitetos, etc.) e militantes comunit�rios a fundar em 2004, o Comit� Brasileiro de Preserva��o do Patrim�nio Industrial (TICCIH-Brasil) [6], se��o nacional da organiza��o internacional The International Comittee for the Conservation of the Industrial Heritage � TICCIH [7]. Entre os objetivos deste comit� est� o apoio �s iniciativas de preserva��o industrial, proporcionando suporte �s comunidades e, eventualmente, aos �rg�os respons�veis do poder p�blico. Al�m disso, deve servir tamb�m como organiza��o de estudos e pesquisa, divulga��o da causa preservacionista, articulando comunidades, organiza��es da sociedade civil, entidades empresariais e sindicais, tanto na preserva��o desse patrim�nio, quanto na busca de alternativas para a sua revitaliza��o.

Uma das maiores car�ncias de todos aqueles interessados na preserva��o do patrim�nio industrial em S�o Paulo � a aus�ncia de dados sistematizados e organizados que possam colaborar para a cria��o de fontes alternativas de preserva��o da mem�ria das classes populares e subsidiar pesquisas e a��es que garantam a sobreviv�ncia desse patrim�nio. Neste sentido, o n�cleo de pesquisas da Funda��o Escola de Sociologia e Pol�tica de S�o Paulo (FESP-SP) [8], com o apoio do professor Leonardo Mello do Departamento de Sociologia da Universidade de S�o Paulo (USP) e da professora Fernanda Pitta do Departamento de Hist�ria da Universidade Cidade de S�o Paulo (Unicid), elaborou a proposta de confec��o de um �Mapa do Patrim�nio Industrial�. Tal instrumento reunir� informa��es b�sicas sobre esse patrim�nio (f�bricas, vilas oper�rias, mapas, fontes escritas e orais, entre outras) em algumas das antigas regi�es industriais da cidade e que atualmente passam por um intenso processo de reurbaniza��o que tem destru�do e colocado em risco in�meras edifica��es e acervos materiais e imateriais de grande import�ncia para a hist�ria social daquelas comunidades e da cidade como um todo.

Al�m de localizar os patrim�nios, o �Mapa� trar� informa��es sobre o atual estado de conserva��o, dados hist�ricos e arquitet�nicos relevantes, bem como fotografias atuais e antigas, desenhos e, eventualmente, depoimentos orais de moradores das comunidades vizinhas �s empresas, al�m de outras refer�ncias importantes para viabilizar, n�o apenas a a��o de organiza��es comunit�rias e interessados na preserva��o do patrim�nio hist�rico e cultural da cidade, mas tamb�m subsidiar os �rg�os respons�veis para a constru��o de efetivas pol�ticas p�blicas nesta �rea.

O projeto, que se encontra em sua fase de planejamento inicial, vem contando com o decisivo apoio de movimentos sociais comunit�rios e de �rg�os respons�veis pela preserva��o do patrim�nio hist�rico, como o Departamento de Patrim�nio Hist�rico da Prefeitura de S�o Paulo. Em conjunto com v�rias dessas entidades e organiza��es, realizamos, em novembro de 2005, o I Workshop Mapeamento do Patrim�nio Industrial em S�o Paulo. Al�m de apresentar e discutir experi�ncias nessa �rea, esse encontro debateu o projeto e forneceu uma s�rie de subs�dios para o seu desenvolvimento. Reunindo especialistas acad�micos, como as professoras Gabriela Campagnol, Leila Di�goli e Manoela Rufioni, representantes do poder p�blico, como Walter Pires (Diretor do Departamento do Patrim�nio Hist�rico da Secretaria Municipal de Cultura) e representantes de movimentos de moradores dos bairros da Lapa e Mooca, o encontro foi uma iniciativa in�dita e importante no processo de discuss�o sobre o patrim�nio industrial em S�o Paulo.

Articulando movimentos sociais, poder p�blico e a comunidade acad�mica em diversas �reas, o projeto Mapeamento do Patrim�nio Industrial em S�o Paulo prop�e, de um lado, a produ��o de um instrumento de pesquisa reunindo fontes alternativas e in�ditas, que possibilitar�o a preserva��o e o resgate de parte fundamental da mem�ria do trabalho e da industrializa��o brasileira, al�m de permitir eventuais compara��es com outras experi�ncias similares. Por outro, o projeto aborda diretamente as complexidades e contradi��es do processo de desenvolvimento e moderniza��o em nosso pa�s, ressaltando o papel da hist�ria e dos atores sociais na constru��o de identidades comunit�rias e da cidadania no Brasil.

Paulo Fontes � professor da Funda��o Escola de Sociologia e Pol�tica de S�o Paulo onde coordena o projeto �Mapeamento do Patrim�nio Industrial em S�o Paulo�. Foi professor visitante na Duke University nos Estados Unidos (2004). � doutor em hist�ria social do trabalho pela Unicamp e autor de Trabalhadores e cidad�os. Nitro Qu�mica � a f�brica e as lutas sociais nos anos 50 (AnnaBlume, 1997). Pesquisador bolsista do CPDOC da Funda��o Get�lio Vargas a partir de mar�o de 2006.

Notas

[1] Um exemplo do otimismo gerado pela industrializa��o de S�o Paulo pode ser visto na exagerada frase pronunciada pelo prefeito Washington Luis ao inaugurar o Pal�cio das Ind�strias: �A cidade � hoje alguma coisa como Chicago e Manchester juntas�.

[2] Cf. Francisco Weffort. �Nordestinos em S�o Paulo: notas para um estudo sobre cultura nacional e cultura popular�, in Jos� Valle Ed�nio (org.). A cultura do povo. S�o Paulo, Cortez e Instituto de Estudos Especiais, 1988.

[3] Cf. Renato Colistete. Labour relations and industrial performance in Brazil: Greater S�o Paulo, 1945-1960.Oxford, Palgrave, 2001.

[4] Cf. Raquel Rolnik e Heitor Frugoli Jr. �Reestrutura��o urbana da metr�pole paulistana: a Zona Leste como territ�rio de rupturas e perman�ncias� (texto datilografado).

[5] Tal processo, no entanto, deve ser relativizado. Embora o setor de servi�os concentre atualmente a maior parte da produ��o econ�mica da cidade, a ind�stria ainda possui um peso bastante importante e S�o Paulo � ainda um grande e din�mico centro industrial. No pr�prio setor de servi�os sobressaem as atividades vinculadas ao setor industrial. Cerca de 40% dos investimentos realizados no munic�pio no final dos anos 90, por exemplo, foram no setor da ind�stria de transforma��o (cf. Pesquisa de Atividades Econ�micas Paulista � Paep, 1999, Seade).

[6] Cf www.patrimonioindustrial.org.br

[7] Cf. www.mnactec.com/TICCIH.

[8] Cf. www.fespsp.org.br

Por que São Paulo se tornou a cidade mais industrializada do país?

Resposta: A concentração de atividades industriais na cidade criou um cenário favorável para uma extraordinária expansão da atividade terciária. A atividade comercial, além de se ampliar, especializou-se. O mesmo aconteceu com a atividade financeira, criação de universidades e importantes centros de pesquisa.

Porque São Paulo é uma cidade industrial?

O café promoveu o desenvolvimento de São Paulo, estimulada pela riqueza cafeeira, a indústria começou a se desenvolver no estado. A indústria é a conseqüente ampliação do mercado consumidor. São Paulo se transformou no estado mais desenvolvido e industrializado do país.

Porque São Paulo é a cidade mais rica do Brasil?

Esta característica de cidade comercial e de composição heterogênea vai acompanhar a cidade em toda a sua história, e atingirá o seu ápice após o espetacular crescimento demográfico e econômico advindo do ciclo do café e da industrialização, que elevariam São Paulo ao posto de maior cidade do país.

Como a industrialização afetou o crescimento da cidade de São Paulo?

Portanto, em resumo, podemos dizer que os efeitos da industrialização na urbanização são: intensificação do crescimento das cidades; concentração populacional; crescimento do setor terciário e a inversão da relação de subordinação entre campo e cidade.

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