Quais as diferenças entre os crimes de receptação e favorecimento real no que tange ao dolo e a natureza do crime?

Lavagem de dinheiro ou favorecimento real?

O crime de favorecimento real encontra-se inserido no Código Penal no capítulo que trata dos crimes contra a administração da Justiça.

Já o crime de lavagem de dinheiro é tratado em lei especial (Lei n.° 9.613/98), mas conforme defendido em artigo aqui publicado, também pode ser indicado como um delito no qual o bem jurídico tutelado é a administração da Justiça.

Além da identidade de bens jurídicos tutelados, em ambos os crimes há a necessidade de ter sido praticado um crime anterior ao favorecimento ou à lavagem, fato que aproxima ainda mais os referidos delitos.

A redação legal dos tipos penais pode gerar dúvidas sobre a correta tipificação da conduta. O crime de favorecimento real está assim previsto:

Art. 349 - Prestar a criminoso, fora dos casos de co-autoria ou de receptação, auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime: Pena - detenção, de um a seis meses, e multa.

Por seu turno, a regra do art. 1° da Lei n.° 9.613/98, tipifica a lavagem de dinheiro nos seguintes termos:

Art. 1o  Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.  Pena: reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa.   § 1º Incorre na mesma pena quem, para ocultar ou dissimular a utilização de bens, direitos ou valores provenientes de infração penal:  I - os converte em ativos lícitos; II - os adquire, recebe, troca, negocia, dá ou recebe em garantia, guarda, tem em depósito, movimenta ou transfere; III - importa ou exporta bens com valores não correspondentes aos verdadeiros. § 2º Incorre, ainda, na mesma pena quem:   I - utiliza, na atividade econômica ou financeira, bens, direitos ou valores provenientes de infração penal;   II - participa de grupo, associação ou escritório tendo conhecimento de que sua atividade principal ou secundária é dirigida à prática de crimes previstos nesta Lei.

Diante disso, pode despontar dúvida ao definir se uma conduta se amolda ao delito de favorecimento real ou à lavagem, dúvida esta que resulta em consequências práticas, afetando desde a investigação – e passando pela imputação contida na denúncia – até o direito de defesa no curso do processo.

Isso sem descurar da disparidade das penas previstas em relação aos dois crimes.

Assim, muito embora os delitos sejam semelhantes, há distinções – tênues do ponto de vista probatório -, mas que são capazes de distinguir uma conduta da outra.

A primeira diferença entre os crimes é que, na prática do favorecimento real, o autor do delito não pode ter concorrido de alguma forma para a prática do crime antecedente (BADARÓ e BOTTINI, 2012, p. 74).

Essa conclusão se atinge pois a conduta “prestar auxílio destinado a tornar seguro o proveito do crime” não engloba as hipóteses de coautoria, nem mesmo os casos subsumidos ao crime de receptação.

Ademais, a conduta “prestar auxílio” será dirigida a terceiro que praticou um crime antecedente (“prestar à criminoso“) o que exclui ser o próprio agente autor desse crime.

Diferente é o que o ocorre com a lavagem, em que o agente pode praticá-la sobre bens, direitos e valores provenientes de um crime anterior que ele mesmo tenha cometido (MENDRONI, 2015, p. 82); tal é a chamada autolavagem ou selflaundering.

Além disso, para que reste caracterizada a lavagem de dinheiro, não basta a mera ocultação do proveito ilícito, há a necessidade de que a intenção do agente seja a de mascarar a origem do bem, visando conferir aparência de licitude.

Com isso, se, por exemplo, uma pessoa mantém em depósito um determinado valor, que sabe ser proveniente de ilícito praticado por terceiro, e objetive que o agente apenas possa resgatar o valor para utilização posterior, restaria configurado o crime de favorecimento real.

No entanto, se o depósito é mantido visando a posterior prática de atos de dissimulação da origem ilícita do dinheiro, está-se diante do crime de lavagem, na modalidade prevista no art. 1º, § 1°, II da Lei 9.613/98.

Trata-se de um elemento a mais exigido pelo crime de lavagem, o que poderia justificar o seu apenamento maior. Nesse sentido:

Ainda que afete a administração da Justiça, o crime em discussão o faz de forma mais incisiva, mais intensa, pois o agente não se contenta em tornar seguro o proveito do crime. Ele vai além, pois busca tal segurança através da reciclagem, do mascaramento, da reinserção dos bens na economia formal, com aparência lícita. Trata-se de uma lesão qualificada à administração da Justiça que afasta a inexigibilidade de conduta diversa. Do agente do crime anterior se espera que atue para  tornar seguro o proveito do crime, mas não que o faça por meio de manobras para conferir a ele aparência lícita, por meio do uso de operações financeiras e comerciais de aspecto legítimo.(BADARÓ e BOTTINI, 2013, p. 77.)

Deste modo, muito embora seja tênue a distinção entre os delitos e se reconheça a dificuldade no âmbito probatório – o que, inclusive, merece especial estudo -, pontuar tais diferenças se mostra de extrema relevância, pelas consequências práticas em toda a persecução penal.

REFERÊNCIAS:

BADARÓ, Gustavo Henrique; BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Lavagem de Dinheiro: aspectos penais e processuais penais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.

BADARÓ, Gustavo Henrique; BOTTINI, Pierpaolo Cruz. Lavagem de Dinheiro: aspectos penais e processuais penais. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013.

MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime de Lavagem de Dinheiro. 3ª ed. São Paulo: Atlas, 2015.

Quais as diferenças entre os crimes de receptação e favorecimento real no que tange ao dolo e a natureza do crime?

Assim, enquanto na receptação o agente quer ter proveito econômico, lucrando com a atividade criminosa de terceiro, a partir de um delito antecedente de furto (por exemplo). No favorecimento real não há essa intenção de lucro, pois o agente apenas quer ajudar o criminoso, sem pretensão de proveito econômico.

Quais as diferenças entre os crimes de favorecimento real e de receptação?

Greco pontua que na receptação o proveito é próprio ou de terceiro, já no favorecimento real o agente “age exclusivamente em favor do autor do delito antecedente” não aproveitando do produto do crime, podendo ser por motivo de amizade ou respeito, em contrapartida na receptação ocorre proveito econômico.

Qual a natureza jurídica do crime de receptação?

A receptação própria é o “adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime”. Trata-se de crime material, pois exige a produção de resultado material (naturalístico).

Qual a diferença entre favorecimento real e de favorecimento pessoal?

Mirabete explica que a diferença é que no favorecimento real “assegura o proveito do crime (por amizade ou em obséquio ao criminoso)” em quanto que o favorecimento pessoal “assegura a fuga, escondimento ou dissimulação do autor do crime”.

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