Quais dificuldades a população enfrenta quanto às condições ambientais do continente africano?

Mariana Balau Silveira

Resumo
Há muitos séculos a África sofre com uma série de problemas relacionados às esferas política, social e econômica. Nas últimas décadas, porém, em adição a grave situação enfrentada, a preocupação dos especialistas recai sobre um problema ainda não tratado de forma intensa e significativa: a questão ambiental africana, suas origens, conseqüências, e meios de reversão desse quadro que já se mostra alarmante.

Introdução

a condição de um dos mais férteis berços da agricultura mundial, o continente africano foi responsável, milênios antes de Cristo, pelo desenvolvimento de técnicas agrícolas revolucionárias, como a irrigação e o uso de fertilizantes no Antigo Egito. Hoje, em pleno século 21, mais de ¼ da população africana sofre com os efeitos da falta de alimentos no continente, além de 34 dos 53 países africanos figurarem na lista dos países menos desenvolvidos do mundo. O continente ainda sofre com a degradação da terra, áreas costeiras e habitat; desflorestamento; escassez de água; erosão de área costeira e desastres naturais como secas e enchentes.

A questão ambiental africana e, com mais efeito, a questão agrícola, é freqüentemente tratada de forma reducionista, levando a questão apenas à esfera geográfica, de modo que os problemas ambientais que o continente enfrenta sejam vistos como resultado, pura e simplesmente, de sua localização, fruto do acaso, e passíveis de degradação desenfreada sem possíveis recursos que retardem os danos. A fome resultante da má gestão dos recursos que o país possui é a maior e mais devastadora conseqüência da ineficácia agrícola africana.

A diminuição dos efeitos devastadores de desastres ambientais e da ineficácia na gestão do potencial agrícola africano é, porém, uma questão a ser analisada como um problema de ordem política, social e econômica, afastando da análise esse viés reducionista do tratamento da questão.

A crise alimentícia de 2008 e a situação africana

Com a produtividade agrícola estagnada, o continente africano, na contramão do que ocorreu nas últimas décadas na América Latina e na Ásia – exemplos da inovação progressiva de maquinário agrícola e tecnologia de plantio – ainda tem como principal técnica a queimada do solo e importa um terço do que consome de grãos através de doações humanitárias e compras governamentais, ao mesmo tempo em que possui um vasto potencial ainda inexplorado, no que diz respeito a possibilidade de avanço nesse setor.

Em 2008 o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) lançou uma publicação intitulada “Africa: Atlas of Our Changing Environment” que apontou outro grave problema ambiental no continente: o desmatamento. Segundo a publicação a África perde cerca de 4 milhões de hectares de florestas anualmente, equivalente a extensão territorial da Suíça e o dobro da média global. Essa queima constante de vegetação provoca um aumento alarmante na concentração de monóxido de carbono, com mais efeito na região noroeste do continente, onde os índices chegam a 250 ppbv.

Lançado em 2008, em plena crise alimentar mundial, o relatório aponta a gestão ineficaz das terras agricultáveis africanas e a incapacidade da produção agrícola de acompanhar o crescimento populacional e reforça o argumento da emergência de soluções relacionadas a esse problema. O relatório ainda afirma que as terras aráveis não estão distribuídas uniformemente por toda a África. O continente possui uma vasta variedade de solos em todo o território.

Os solos africanos: técnicas e perspectivas

Mais da metade das terras africanas é composta de desertos ou de terrenos inadequados para a prática da agricultura. Um quarto da área continental africana pode ser classificado como apenas de médio e baixo potencial, muitas vezes exigindo o cultivo de forma sustentável. Uma grande parte dos solos classificados como de médio potencial são latossolos intemperizados e lixiviados de minerais e pobres em nutrientes, necessitando de significativos aportes de nutrientes para um desenvolvimento agrícola sustentável. Uma prática tradicional em regiões onde esse tipo de solo predomina é a Agricultura Itinerante, que utiliza a queima de gás natural vegetal para fornecer os nutrientes necessários.

Solos do tipo chernozem, localizados em torno da Bacia do Congo bem como na Serra Leoa e na Libéria, no oeste da África, contam com potencial agrícola moderado (FAO, 2007). Ao longo das margens dos desertos da África o solo requer uma gestão cuidadosa em virtude da alta alcalinidade.

Alguns solos são ideais para a agricultura na África. Em torno de apenas 10 por cento das terras agrícolas africanas tem camadas permeáveis profundas, nutrientes adequados, e não sofrem nenhum dano em sua umidade ou qualidade do solo. Muitos destes estão localizados ao sul do Sahel, no Senegal, Mali, Burkina Faso, Gana, Togo, Benin, Nigéria e Chade.

Áreas de primordial importância agrícola também podem ser encontradas no sul da África em países como Moçambique, Zâmbia, Zimbabue e do África do Sul. Essas terras resistentes e produtivas são caracterizadas pela Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO) como Andossolos.

Outros sete por cento das terras agricultáveis africanas requer uma gestão eficaz, pois possui alto potencial agrícola. A maioria destas áreas tem um dos quatro principais tipos de solo agricultáveis, em países como a Costa do Marfim, o sul de Gana e a Tanzânia, mas não possui técnicas avançadas o suficiente para que esse potencial seja explorado.

A nova questão continental e suas conseqüências

Além da questão geográfica, porém, há uma série de fatores políticos que pioram as condições dos moradores da região. Segundo o professor de geografia e estudos globais da Universidade de Minnesota, nos EUA, Abdi Samatar: “Não é o fator natural que está produzindo a fome. A ONU e o mundo ocidental estão dizendo que é uma seca que assolou as pessoas. Nessa parte do mundo as secas são endêmicas. Elas acontecem a cada poucos anos, mas as pessoas desenvolveram mecanismos para lidar com isso durante os anos. Esses mecanismos foram destruídos pela guerra civil, pela guerra ao terror e pela ocupação etíope. As pessoas ficaram tão vulneráveis que elas perderam tudo o que tinham antes de a seca chegar. Quando a seca chegou, eles já não tinham nada e ficaram famintos”.

A declaração do professor explicita um desenvolvimento sustentado por esquemas estatais ambiciosos, como a tentativa de produção de grãos em larga escala, enquanto as complexas estruturas fundiárias tradicionais tentam racionalizar a produção, concomitante à seca e às guerras civis que minimizam as possibilidades de avanço.

A gestão eficaz da agricultura africana traz benefícios para além da solução do problema da fome.  As atividades envolvidas no plantio e cultivo de alimentos tendem a criar empregos locais para a população carente. O desenvolvimento agrário faz com que as pessoas fiquem no campo e cuidem de suas terras, uma das poucas propriedades que a maioria dos agricultores africanos pobres possui. Além disto, o crescimento da produção de alimentos deve forçar para baixo os preços dos itens de subsistência, o que será de grande auxílio para a população que, mesmo ao lado de grandes áreas rurais, ainda consome uma parcela ínfima dos alimentos.

A atividade agrícola é vital para a economia de todo o continente. De acordo com o último relatório da ONU, ela representa 40% das exportações, 30% do Produto Interno Bruto (PIB), quase 30% dos ganhos cambiais e 70 a 80% dos empregos em toda a África. Das 30 economias agrícolas que apresentam os índices de crescimento mais altos, 17 estão localizadas na África, conforme apontou o Instituto de Desenvolvimento Externo, com sede no Reino Unido.

Nos últimos anos, e principalmente após a crise de 2008, o continente vem recebendo ajuda de ONGs que visam o auxílio na pesquisa e desenvolvimento de técnicas que estejam ao alcance dos governos africanos e dos produtores locais. A presença de alianças entre esses atores se mostra, primariamente, um esboço de uma solução em longo prazo. Um dos maiores exemplos foi o da Aliança para a Revolução Verde da África (Agra, em inglês), que recebeu US$ 150 milhões da Fundação Rockefeller, dos EUA. A instituição garante que 1% de crescimento na agricultura representa 1,5% de crescimento em toda a economia e, portanto, vem tentando combinar ciência e pesquisa com as necessidades das atividades agrícolas e dos agricultores para fornecer o equivalente tecnológico que foi o estopim da transformação asiática.

Considerações Finais

O debate principal, aqui, se volta ao papel da tecnologia e o delicado equilíbrio entre envolver agricultores nas decisões-chave e ampliar o horizonte deles com relação às novas técnicas e tecnologias, e ao mesmo tempo lidar com governos corruptos, e contrários a tentativa de implementação de novas técnicas financiadas, seja pelo governo, seja por outras instituições financiadoras, que comecem pela gestão de terras cuja agricultura é de subsistência.

Steve Wiggins, especialista em agricultura da África e América Latina, alerta que as atenções que a agricultura africana vem despertando apontam para grandes riscos: uma tendência em querer se reinventar a roda, resgatar idéias que já se provaram errôneas e tomar decisões sobre questões delicadas sem nenhuma informação, como, por exemplo, a biotecnologia e culturas orgânicas. Wiggins afirma que o progresso depende de muitos fatores que vão além de simplesmente dar condições aos agricultores aumentar a produção dentro de uma economia mais estável.

Ainda segundo ele, o papel do estado será vital – de forma direta, através da pesquisa e desenvolvimento agrários, mas também de maneira indireta. Deve existir investimento sustentável a longo-prazo na construção de estradas e sistemas ferroviários aliados a existência de um ambiente estável que propicie e encoraje a tomada de riscos, garantindo-se assim que os agricultores e o Estado estejam preparados para intervir e garantir a continuidade da demanda. Acima de tudo, todavia, os governos devem estar preparados para serem flexíveis – abrindo mão da utopia de um único plano agrícola nacional em prol de planos locais e estratégicos. Esta é a única maneira, segundo o especialista, de se obter o máximo das condições adversas existentes no continente africano.

Referências

Africa: Atlas of Our Changing Environment.

Disponível em:

//www.unep.org/dewa/africa/africaAtlas/

África 21

//www.africa21digital.com/noticia.kmf?cod=12622753&indice=30&canal=407

Diário Digital

//www.africanos.eu/ceaup/uploads/NOT42_22.pdf

G1

//g1.globo.com/mundo/noticia/2011/08/entenda-seca-no-chifre-da-africa.html

The Guardian

//www.guardian.co.uk/katine/2008/jul/09/background.livelihoods

The State of Food and Agriculture – FAO

Disponível em:

//www.fao.org/docrep/010/a1200e/a1200e00.htm

Quais os principais problemas ambientais enfrentado pela população africana?

A falta de água potável, aumento do nível das águas do mar, que está a acidificar e a contaminar os lençóis freáticos em terra, o lixo e os resíduos sólidos, as queimadas, a desflorestação, a desertificação, as secas, as inundações, a perda da biodiversidade e o ordenamento do território são alguns dos problemas ...

Quais são as causas dos problemas ambientais?

As maiores causas de problemas ambientais são: crescimento populacional, uso insustentável e ineficiente de recursos, a pobreza e a não inclusão dos custos ambientais da utilização dos recursos nos preços de mercado de bens e serviços.

Qual região do continente africano mais sofre com as questões ambientais e danos em relação ás populações em áreas de conflitos?

As regiões mais problemáticas estão no Sahel, zona de transição entre o Saara e as savanas, e nas áreas tropicais do continente — onde se localizam os três países devastados pelo Idai.

Por que o continente africano convive com graves problemas sociais?

Diminuição das pastagens e terras férteis no continente. Os conflitos étnicos que resultam em guerras civis. Em suma, o que temos é um quadro socioeconômico bastante debilitado, e as perspectivas são negativas em relação a esse continente.

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