Há dez anos, falia o banco de investimentos Lehmann Brothers, o quarto maior dos Estados Unidos à época, acendendo o estopim para a mais grave crise econômica mundial em 80 anos. Países em todo o mundo, em maior ou menor grau, foram atingidos. Em 2009, pela primeira vez em décadas, a economia mundial se retraiu. Alguns países saíram rapidamente da crise, outros sentiram os efeitos até recentemente, como é o caso da Grécia. Show
Crises de proporção global tem se tornado mais frequentes. Desde 1929, quando a pior delas foi detonada pelo crash da Bolsa de Valores de Nova York aconteceram, pelo menos quatro que tiveram grande impacto ou atingiram fortemente algumas das maiores economias do mundo: no início dos anos 80, países da América Latina – incluindo o Brasil – foram atingidos pela crise da dívida; em meados daquela década estourou a bolha do mercado imobiliário no Japão, travando o forte crescimento daquele país; em meados dos anos 90, a crise voltou aos mercados emergentes, atingindo novamente o Brasil; e, em 2008, a crise que ficou conhecida como a do “subprime”, com raízes no aumento na inadimplência dos financiamentos imobiliários. Essas crises não são um fenômeno recente. Dois livros – “Salve-se quem puder: uma história da especulação financeira” (Companhia das Letras), de Edward Chancellor, e “Manias, Pânicos e Crises”, de Charlie Kindleberger e Robert Aliber (Saraiva) – mostram que o fenômeno é mais antigo. As duas primeiras que tiveram um impacto internacional foram a Mania das Tulipas, detonada nos Países Baixos, em 1637, e a Crise dos Mares do Sul e da Companhia do Mississipi, em 1720. Leia, a seguir, as cinco principais crises que movimentaram a economia mundial a partir de 1929: 1929 - A Grande DepressãoApós a Primeira Guerra Mundial, os Estados Unidos entraram em uma fase de grande prosperidade econômica, particularmente nos anos 20. A Europa estava completamente arrasada pelo conflito. Mas os “anos felizes” não duraram muito. A partir de 1925, a Europa começou a se reerguer, recuperando mercados consumidores e passando a comprar menos dos norte-americanos. Embora as exportações americanas tenham diminuído, o ritmo de produção permaneceu o mesmo. Com os estoques em alta e os preços em queda, várias empresas foram à falência. O marco da crise de superprodução foi a queda das ações da Bolsa de Valores de Nova York, em 29 de outubro de 1929. Nos três anos seguintes, o PIB mundial encolheu 15%. Só nos Estados Unidos, a produção industrial encolheu 46% entre 1929 e 1932. O desemprego chegou a 25%. Para complicar o cenário, muitos países passaram a adotar medidas protecionistas, o que favoreceu uma maior retração. Nesses três anos, o comércio exterior americano encolheu 70%; o britânico, 6%; o francês, 54%; e o alemão, 61%. Leia também: A crise de 1929 completa 80 anos A recuperação nos Estados Unidos começou em 1933. Para superar a crise, o presidente Franklin Roosevelt (1933-1945) adotou um programa de medidas conhecido como New Deal, que rompia com o princípio da não intervenção do Estado na economia. Entre as medidas que foram adotadas estavam o controle dos preços de diversos produtos, a realização de obras públicas para oferecer trabalho aos desempregados, a criação de seguro-desemprego e o controle das produções agrícola e industrial, para que se tornassem compatíveis com o nível de consumo. Foram necessários 10 anos para que o PIB americano voltasse aos níveis de 1929. E mesmo no início da Segunda Guerra Mundial, o desemprego ainda era elevado: 15%, em 1940. 1980 - A crise da dívida dos países da América LatinaNos final dos anos 60 e em boa parte dos anos 70, países latino-americanos aproveitaram o crédito barato e abundante e se endividaram rapidamente. Os recursos foram aplicados principalmente em projetos de infraestrutura. Os países tiveram altas taxas de crescimento. Entre 1967 e 1974, o PIB brasileiro, por exemplo, dobrou de tamanho. Os problemas começaram no final da década com a explosão dos preços do petróleo, que causou um aumento na inflação americana. A maior economia global foi obrigada a aumentar os juros para conter a inflação. Isto pesou nos países em desenvolvimento porque boa parte dos recursos fora emprestado com base em taxas pós-fixadas (definidas no pagamento). E para agravar a situação, os EUA passaram por um processo de regulamentação do sistema financeiro, o que dificultou a concessão de novos empréstimos. Nesse cenário, as economias tiveram o crescimento limitado e passaram a enfrentar severos problemas de inflação. Segundo dados do IBGE, nos anos 70 a economia brasileira cresceu 131,3%. Nos 80, 33,5%. E, de acordo com a FGV, a inflação média anual passou de 29,9%, para, 243,9% nos anos 80. 1985 - A bolha imobiliária e das ações no JapãoUma onda de euforia tomou conta do Japão nos anos 80. Segundo o FMI, entre 1980 e 1991, o PIB cresceu 66,2%. Para muitos economistas, era questão de tempo para que o país asiático se tornasse a maior economia mundial, motivada pela política de manter valorizado o iene. O otimismo tomou conta das empresas e os investimentos cresceram devido à abundância do crédito. Ao mesmo tempo, cresceu o consumo. Um quadro de Van Gogh foi vendido para um empresário por US$ 90 milhões, o maior valor pago por uma pintura até hoje. O crédito fácil impulsionou o mercado imobiliário. O preço dos imóveis chegou a dobrar em três anos. Os problemas começaram em 1989. Diante da alta nos preços do setor imobiliário, o BC japonês orientou as instituições financeiras a limitarem a taxa de crescimento dos empréstimos bancários. A farra dos refinanciamentos de imóveis acabou deixando muita gente em dificuldade financeira, pois muitos contavam com o elevado valor dos aluguéis para pagar os juros dos financiamentos. Os preços caíram pela metade entre 1990 e 1991. O efeito se estendeu pelo restante da economia: dificuldades financeiras levaram muita gente a vender imóveis. Os preços das propriedades caíram levando a reboque o preço das ações. Os reflexos são sentidos até hoje: desde 1992, só em seis anos a economia japonesa cresceu a um ritmo superior a 2%. A crise não se restringiu ao Japão. Praticamente no mesmo período, os países da Escandinávia e a Finlândia enfrentaram bolhas imobiliárias e de ações. 1994 - A crise dos mercados emergentesUma série de crises atingiu os mercados emergentes a partir de 1994. O primeiro a sentir os problemas foi o México. A confiança dos investidores no país tinha crescido a partir dos anos 90, com a adesão do país ao Nafta. O PIB crescia próximo aos 4% ao ano. No período pré-eleitoral de 1994, adotou-se uma política fiscal e monetária expansiva. Títulos mexicanos de curto prazo, emitidos em pesos, garantiam seu pagamento em dólares. Mas a instabilidade política crescia: conflitos agrários e com movimentos indígenas no Sul do país e o assassinato do líder nas pesquisas para as eleições presidenciais, Luís Donaldo Colosio. O aumento no risco despertou a atenção dos investidores. O peso também estava sobrevalorizado e o país tinha déficits na balança comercial. O dinheiro investido no México começou a ser retirado rapidamente. Para manter o valor da moeda, o BC mexicano começou a queimar as reservas. E no final do ano, foi obrigado a desvalorizar o peso. Um consórcio financeiro liderado pelos EUA e FMI liberou US$ 50 bilhões para o país em 1995. Nesse ano, o país passou por uma violenta recessão, com o PIB encolhendo 6,3%. A segunda fase da crise dos mercados emergentes atingiu os países do Sudeste Asiático em 1997. Apesar das fortes taxas de crescimento – superiores a 6% ao ano a partir de 1987, as economias tinham sérios problemas. O endividamento externo era crescente e os países passavam por “bolhas de crédito”, com facilidade na liberação de recursos para estimular o crescimento. Os países também tinham déficits nas contas externas. A situação começou a se complicar a partir de 1995, quando um acordo internacional resultou na desvalorização do iene japonês e do renmimbi chinês frente ao dólar americano. E, diante do aumento na inflação nos EUA, o Fed (o BC americano) começou a elevar as taxas de juro. A valorização da moeda americana criou um complicador para os países do Sudeste Asiático, que mantinham suas moedas atreladas ao dólar: suas exportações se tornaram menos competitivas. Não bastasse isso, o preço mundial dos semicondutores – um de seus principais produtos de exportação – começou a cair. Uma série de ataques especulativos passou a atingir as moedas da região. Os primeiros, em maio de 1997, atingiram a Tailândia. Inicialmente, o país resistiu a desvalorizar a moeda local, mas diante do esgotamento de reservas, foi obrigado a fazê-lo. O alvo seguinte foi a Indonésia. A taxa de câmbio despencou e uma ajuda do FMI foi insuficiente para conter o problema. A procura por dólar era grande e as empresas sentiram violentamente o impacto. Protestos nas ruas resultaram, em maio de 1998, na queda do ditador Suharto, que estava no poder há 31 anos. Outros países da Ásia, como a Coreia do Sul e a Malásia, também foram afetados. A partir de 1998, o foco mudou de atenção. A crise na Ásia diminuiu a demanda por commodities, o que acabou reduzindo os preços do petróleo e dos minerais não ferrosos, importante produtos de exportação da Rússia. O país teve uma saída problemática do comunismo. Dados do Fundo Monetário Internacional mostram que o PIB encolheu 40,1% entre 1991 e 1996. Com esse quadro, o país foi obrigado a desvalorizar o rublo e suspender o pagamento de dívidas a credores estrangeiros. A crise também marca a ascensão ao poder de Vladimir Putin, um ex-funcionário da KGB (a polícia secreta dos tempos do comunismo). E, de acordo com dados do Banco Mundial, somente em 2007 que a Rússia conseguiu que a sua economia voltasse aos níveis de 1989. O próximo país a ser atingido foi o Brasil. Apesar de o Plano Real, de 1994, ter sido bem sucedido para acabar com a forte inflação que marcara o país desde os anos 80, o país apresentava problemas estruturais, como juros elevados e câmbio sobrevalorizado. E mesmo com o corte de despesas e o aumento da carga tributária, o Brasil sofria com o aumento da dívida externa e a dívida pública. A situação piorou com as crises nos países asiáticos e na Rússia. O fluxo de recursos internacionais para os países emergentes se esvaiu. Sem opção, o Brasil foi obrigado a desvalorizar o real em janeiro de 1999. Por dois anos seguidos (1998 e 1999), a economia brasileira patinou. 2008 - A crise mundial do subprimeA crise mundial de 2007-8 é considerada pelos economistas como a pior desde o crash da Bolsa de Valores de Nova York. A economia mundial vinha crescendo a taxas próximas a 5% desde 2004, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI). Mas os problemas no mercado imobiliário americano se acentuaram, com o aumento da inadimplência por causa das altas taxas de juro, levando grandes instituições financeiras à falência, como os bancos de investimento Lehman Brothers, Bear Stearns e Merril Lynch. Isto contribuiu para causar uma grande crise global de confiança. Países como Estados Unidos e Reino Unido foram obrigados a intervir no sistema financeiro. O governo norte-americano saiu em socorro de suas instituições financeiras. O congresso daquele país aprovou um pacote de US$ 700 bilhões para comprar ações de instituições com problemas de liquidez. Na Inglaterra, o primeiro-ministro Gordon Brown anunciou um pacote de 500 bilhões de libras esterlinas (US$ 867 bilhões) para socorrer o sistema bancário do país. Leia também: Crise no centro do capitalismo Na Islândia, os três maiores bancos privados tiveram de ser assumidos pelo governo. A cautela passou a ditar a ordem no sistema financeiro: fontes de crédito secaram, com o dinheiro indo para aplicações mais seguras, mas menos rentáveis, como os Treasuries americanos. O resultado foi um freio no crescimento: a economia mundial se expandiu 3% em 2008 e encolheu 0,15%, em 2009. O Brasil anunciou uma medida provisória que possibilitou que bancos oficiais pudessem comprar participações em instituições financeiras menores. Além disso, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) disse que ajudaria empresas exportadoras em dificuldades após perdas com operações de derivativos de câmbio. A crise teve consequências. Com a retração do crédito, países altamente endividados como Portugal, Espanha, Grécia e Itália passaram a enfrentar problemas para rolar suas dívidas. Em maior ou menor grau, tiveram de adotar medidas de ajuste. Entre 2008 e 2013, a economia grega encolheu 26,5%, não se recuperando, até hoje, aos níveis pré-2008. E, politicamente, as fortes turbulências mundiais contribuíram para a expansão de movimentos populistas e antissistema. Como o governo brasileiro enfrentou a crise de 2008?Como a crise de 2008 afetou o Brasil? Nos primeiros dias após a segunda-feira negra, as principais influências da crise de 2008 na economia brasileira foram na queda no valor das ações e aumento no preço do dólar. Em seguida, houve uma diminuição do crédito e redução dos investimentos internacionais.
Quais medidas foram tomadas para amenizar a crise de 2008?Para tentar manter a economia aquecida em meio à crise que tomou proporções mundiais, o governo brasileiro adotou uma série de medidas, como redução de impostos para estimular o consumo, congelou preços do petróleo, subsidiou as tarifas de energia elétrica e ampliou as desonerações.
O que poderia ter evitado a crise de 2008?A crise financeira de 2008 foi um desastre que poderia ter sido evitado e, no entanto, foi provocado por vários erros de regulamentação do governo, pela má administração das empresas e pela insensata avidez do risco de Wall Street, segundo as conclusões de um inquérito federal.
Qual foi a solução encontrada para a crise dos Estados Unidos da América?Surgido para recuperar a economia norte-americana após a crise de 1929, o New Deal foi um plano econômico que modificou a relação do Estado com a economia. Roosevelt reformulou a relação entre o Estado e a economia.
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