Barroco O poema que vamos ler foi escrito no século XVII. Trata-se de um soneto. Soneto é todo poema que tem dois quartetos e dois tercetos. O poeta descreve a figura da mulher amada e procura expressar os sentimentos que ela desperta nele. A análise do soneto permite conhecer alguns aspectos do relacionamento amoroso tal como era visto na época. À mesma dona Ângela Anjo no nome, Angélica na cara! Quem vira uma tal flor, que a não cortara, Se pois como Anjo sois dos meus altares, Mas vejo, que por bela, e por galharda, Vocabulário uniformar: uniformizar vira: veria luzente: brilhante, luminaso idolatrara: idolatraria fôreis: fôsseis custódio: que guarda, que defende ou protege galhardo: garbaso, elegante Estudo do Texto 1) A palavra latina angelus deu origem, em português, ao substantivo
anjo. Que outras palavras do texto têm relação sonora ou de significado com a forma latina angelus? 2) Angélica pode ser também o nome de uma flor. Portanto, o poeta vê dona Ângela como mulher-flor e mulher-anjo. a) Qual desses elementos pertence ao mundo físico? b) Qual deles faz parte do mundo espiritual? c) Esses elementos também se opõem pela sua duração. Qual deles é o eterno, e qual é o que tem vida breve? 3) Por ser anjo e flor, a mulher desperta sentimentos contraditórios no poeta. Esses sentimentos revelam-se através de dois verbos da segunda estrofe. a) Que verbo indica o desejo do poeta em relação à mulher-flor? b) E em relação à mulher-anjo? 4) Na terceira estrofe, o poeta identifica o papel que caberia à mulher-anjo. Copie o verso que expressa tal ideia: 5) Dona Ângela, sendo também matéria (flor), não pode ser apenas anjo. Por isso, na última estrofe, há uma frase que destoa da ideia de anjo. Copie essa frase. Conclusão I – ÉPOCA Nos séculos XVI e XVII, grandes mudanças políticas, econômicas e filosóficas consolidam uma tendência oposta, conhecida como Renascimento, que conduz a uma nova maneira de enxergar o mundo: o antropocentrismo, isto é, o homem considerado como sendo o centro do Universo. No antropocentrismo, o homem não é apenas e tão-somente “uma imagem de Deus”, mas é visto como ser humano, ligado à sua natureza física. O espiritualismo e a religiosidade medievais cedem lugar à valorização dos aspectos materiais da existência. O teocentrismo entra em declínio e a Igreja começa a perder sua liderança. Isso não significa, entretanto, que a religiosidade medieval tenha desaparecido. Ela apenas perde sua predominância, mas continua existindo em estado latente, para tornar-se de novo evidente na época do Barraco. Se esquematizarmos essa situação, teremos o seguinte possível gráfico: Diante dos avanços das concepções antropocêntricas de mundo, reforçadas pela Reforma protestante, a Igreja reage com um movimento denominado Contra-Reforma. II- O ESTILO O nome barroco tem origem, provavelmente, numa palavra utilizada no século XVI para designar um tipo de pérola que tinha forma irregular. A palavra “irregular” é bem adequada para o caso, pois mostra uma das características fundamentais do estilo barroco: a tensão, que é consequência de uma visão de mundo que procura conciliar tendências contraditórias (o teocentrismo medieval e o antropocentrismo renascentista), uma visão de mundo que busca a fusão do velho com o novo. O estilo barroco e o meio de expressão do homem da época, saudoso “da religiosidade medieval e, ao mesmo tempo, seduzido pelas solicitações terrenas e pelos valores do mundo – amor, dinheiro, luxo, aventura, posição social” (Afrânio Peixoto). 1. Como o homem barroco vê o mundo O homem barroco vai enfatizar tudo aquilo que é inconsistente, tudo o que muda de aparência, tudo o que está em movimento, pois para ele o mundo é uma coisa dinâmica, em constante mudança. Veja, por exemplo, como um elemento da natureza (a água) aparece num texto barroco. Claras as águas são, e transparentes, 2. Como se expressa essa visão de
mundo 1.Solidão 2. Sentimento de agonia 3. Sentimento da passagem irremediável do tempo Observe como o escritor Gregório de Matos expressa esse sentimento de frustração diante da pouca duração das coisas: Moraliza o poeta nos ocidentes do Sol Nasce o Sol, e não dura mais que um dia, Porém, se acaba o Sol, por que nascia? Mas no Sol, e na Luz falte a firmeza, Começa o mundo enfim pela ignorância, Ao expressar esses conteúdos, o escritor barroco utiliza com freqüência recursos de linguagem como: a) metáfora (espécie de comparação direta): considerando o mundo como algo nebuloso, sem nitidez, o barroco não revela os elementos da realidade, mas apenas os representa indiretamente. Para isso, serve-se da metáfora. Em vez de dizer o nome comum das coisas, ele prefere apenas evocar, sugerir tais coisas. Observe, por exemplo, como aparece num poema barroco uma metáfora para a ideia de mágoa, tristeza: Não sei que nuvem trago neste peito, b) antítese (oposição de ideias): e um recurso de estilo muito comum na linguagem barroca. Talvez seja o elemento fundamental do barroco. A antítese revela o contraste que o escritor vê em quase tudo. Daí nasce uma oposição entre carne e espírito, entre sensualismo e misticismo, religiosidade e erotismo, céu e terra, prazer e castigo, aparência e essência etc. Veja como o escritor Manuel Botelho de Oliveira salienta os aspectos contrastantes ao descrever uma ilha: Vista por fora e pouco apetecida c) paradoxo (união de ideias contraditórias num só pensamento): observe a paradoxo contido neste fragmento de Gregório de Matos, em que o poeta procura expressar a paixão e o refreamento dela: Ardor em coração firme nascido! d) linguagem rebuscada: há preferência pelas estruturas gramaticais mais complicadas e rejeição do vocabulário popular. Observe a ordem indireta nestes versos: Um velho vi, que andava
passeando, (Vi um velho de demarcada e incógnita estatura que andava passeando.) De Anarda o rosto luzia (O rosto de Anarda luzia no vidro que a retratava.) e) registro de impressões sensoriais (gosto, visão, olfato, tato, audição): Como exalas, penhasco, o licor puro, (Nesse caso, o poeta registra a passagem de um rio pela mata.) Chora festivo já, cristal sonoro… (Idem) (cristal sonoro = rio corrente) Assim também meu coração queixoso III – AUTORES E OBRAS 1. Gregório de Matos 2. Padre Vieira imagens – CARAVAGGIO |